Era uma vez um menino e uma menina
que tinham um cesto muito bonito repleto de maçãs brilhantes e saborosas. Havia
maçãs de todos os tipos e feitios: maçãs do amor, maçãs da paz, maçãs da
comunicação, maçãs da risota, maçãs da cumplicidade, maçãs das viagens, maçãs
dos fins-de-semana, maçãs de cinema, de praia, de música, de amizade, de
confiança, de ternura, de medo, de dúvidas, maçãs de honestidade, maçãs de
respeito, de livros, de comida, enfim, todas as maçãs da vida a que os meninos
e meninas têm direito quando decidem cuidar juntos do seu cesto.
O menino e a menina costumavam
partilhar essas maçãs com grande prazer e tentavam garantir que esse cesto
nunca ficasse vazio. Mas por vezes apareciam maçãs que começavam a apodrecer e
que ameaçavam estragar todas as outras por contágio se não fossem rapidamente tiradas
e tratadas. A menina era a que mais se preocupava com este cuidado. E gostava
muito de manter o cesto limpo e arrumado, com as belas maçãs dispostas
harmoniosamente e sempre prontas a serem partilhadas. O menino gostava mais de
as baralhar e desarrumar. A menina não se importava muito com isso, chegava às
vezes até a fazer o mesmo só para se sentir mais próxima do menino e aprender
com ele a arte da desarrumação. E também porque para ela, limpar e arrumar as
maçãs que partilhava com tanto amor com o menino, era algo que lhe dava muito
gosto. Ela estava sempre pronta para o surpreender com a maçã mais bonita e
saborosa, tentava sempre encontrar a maçã que ele mais iria gostar. O menino
ficava sempre muito feliz e isso fazia a menina sentir-se no céu. O menino
também se esforçava por estar atento aos desejos da menina, e no seu modo
próprio também a surpreendia com as mais belas maçãs.
A menina adorava experimentar de
todas as maçãs com o menino, chegando mesmo a sonhar como seria esta ou aquela,
experimentar uma disposição diferente, imaginar e projectar como seria aquele
cesto no futuro. O menino era mais avesso a essas divagações, receava que sonhar
e projectar fosse algo de perigoso. A menina era quem mais se preocupava com as
maçãs podres que por vezes teimavam em aparecer. O menino não se apercebia
tanto, estava a atravessar uma fase muito difícil na vida dele. E na realidade
para ele isso era uma chatice, quase como se ele ao não querer ver as maçãs que
apareciam podres, imaginasse que talvez estas desaparecessem magicamente sem
causar danos. E assim o menino afastava-se muitas vezes do cesto das maçãs, recusando
e negando a realidade que teimava em impor-se, deixando muitas vezes a menina
sozinha nesse cuidar.
De início ela não se importava de as
agarrar, descascar, limpar e comer o que ainda estava bom, pois sabia que ele
não estava tão capaz de o fazer, mas sentia sempre que era algo que deveria ser
feito a dois, pois cabia a ambos garantir que o cesto nunca apodrecesse por
completo. E por isso, quando sentia que era altura de o fazer com o menino,
chamava-o e dizia-lhe “está uma maçã podre no cesto”, mas o menino ficava muito
zangado com ela. Sentia sempre que ela lhe estava a dizer que era culpa dele.
O menino tinha dificuldade em
compreender que ela apenas se queria sentar com ele para juntos cuidarem
daquela maçã que ameaçava apodrecer o cesto todo caso não fosse pacientemente
descascada, limpa e partilhada. A culpa não era de ninguém na realidade, eles
eram apenas um menino e uma menina que estavam a aprender a cuidar do seu cesto
de maçãs pela primeira vez.
Então a menina, sentindo-se muito triste e
incompreendida, deixava a maçã podre no topo das outras maçãs, na esperança que
o menino não se esquecesse do pedido dela. Mas ele quando via a maçã, pegava
nela e colocava-a no fundo do cesto, tapada pelas maçãs saudáveis: não a vendo
é como se não existisse, talvez chegasse a ficar boa outra vez. E a menina
ficava sempre com muito receio, pois sabia que estava uma maçã podre, bem
escondida, mas bem real, a contaminar o resto do cesto. Por diversas vezes
pegou ela mesma sozinha na maçã e tratou dela com carinho e cuidado, pois sabia
que os cestos de maçãs que os meninos e meninas de todo o mundo partilham, têm
de ser diariamente cuidados e tratados pelos dois. Por vezes o menino deitava
fora a maçã podre, esquecendo-se que assim ambos perdiam a possibilidade de
provar aquela maçã tão específica e aprenderem com ela uma das muitas lições da
vida.
Com o passar do tempo, a menina foi
ficando mais desgostosa, pois temia não conseguir dar conta do recado sozinha.
As maçãs podres teimavam em crescer bem lá no fundo do cesto. Então, um dia
abordou o menino mais uma vez e disse-lhe “estão várias maçãs podres no cesto”
e o menino ficou muito zangado e virou-lhe as costas, disse que não queria
saber das maçãs, que a culpa não era dele. A menina nesse dia perdeu a cabeça e
zangou-se, atirou-lhe todas as maçãs podres à cara. Ele foi-se embora muito
magoado e zangado. A menina ficou sem poder explicar e entender o que aquelas
maçãs podres poderiam estar a fazer à cesta deles. E o menino também. Mais
tarde, nesse dia, a menina pediu desculpa e disse que queria falar com ele. O
menino também pediu desculpa e encontraram-se, mas com a condição de nesse dia
esquecer o sucedido e nada falarem.
E nos dias seguintes, tanto a menina
como o menino não mexeram mais no cesto de maçãs. Mas a menina angustiava-se ao
ver as maçãs podres junto das saudáveis. E esperava que o menino também se
preocupasse, e que a seu tempo se juntasse a ela para tornarem o seu cesto de
maçãs saudável novamente. Ela sabia que se todo o cesto apodrecesse nada mais
haveria para eles cuidarem e partilharem em conjunto. E isso era algo que ela
não queria, gostava demasiado do menino e sabia que ele também gostava dela.
A menina esperou e esperou. As maçãs
foram apodrecendo, uma a uma, e o menino continuou a fingir que nada se tinha
passado ou se estava a passar. A menina foi ficando cada vez mais triste e
percebeu que ficar ali sozinha perante um cesto de maçãs a apodrecer só lhe
fazia mal e foi-se afastando cada vez mais. Também ela virou as costas ao
cesto, mas sem nunca esquecer o que se estaria a passar dentro do mesmo. O
menino foi-se escondendo nos seus afazeres do dia-a-dia, como se nada passasse.
Finalmente um dia, o menino percebeu
que a menina estava diferente com ele, mais distante e triste, e decidiu falar
com ela. A menina aceitou esperançada. Mas quando se juntaram para olhar o seu
cesto de maçãs e partilharem a maçã da paz e do entendimento, já nada havia no
cesto: as maçãs tinham apodrecido todas… E foi com grande dor e tristeza que
olharam pela última vez em conjunto aquele cesto que tinha sido outrora tão
bonito e tão rico de maçãs vistosas e saudáveis. Já nada havia para cuidar. Num
último gesto de despedida, juntos despejaram as maçãs podres do cesto e
partiram para o mundo com a maior lição que a vida tinha para lhes ensinar: que
um amor que não é cuidado e partilhado, tanto no bom, como no mau, acaba sempre
por apodrecer silenciosa e insidiosamente, para no lugar dele nada ficar, a não
ser a dor e o sofrimento de um vazio um dia antes soberbamente preenchido.
Muito bom mas um piriri triste !! Gusto
ResponderEliminarTanto do que escreves Bjs lindos Tiago
Obrigada meu amor, é bom saber isso!
ResponderEliminar:)
Miss you***